Mistério para a expansão do Universo pode ter resposta mais simples do que parece

Um estudo publicado recentemente na revista Galaxies propõe uma nova explicação para a expansão acelerada do Universo. Segundo os autores, a matéria escura e a energia escura podem ser apenas ilusões criadas por variações nas forças fundamentais da natureza, como a gravidade e o eletromagnetismo.

Observações levaram à ideia mais aceita entre os cientistas de que o Universo vem se expandindo desde o Big Bang. Há cerca de cinco a seis bilhões de anos, porém, essa expansão começou a acelerar. Para explicar o fenômeno, a cosmologia atual recorre à chamada energia escura. Já os movimentos anômalos das galáxias e grandes estruturas cósmicas são atribuídos à matéria escura, uma forma invisível de matéria que interage apenas pela gravidade.

Representação artística do Universo em expansão. Crédito: Anshuman Rath – Shutterstock

O problema é que, mesmo com décadas de pesquisas, nenhuma dessas duas entidades foi observada diretamente. Sua existência é inferida apenas por efeitos gravitacionais, como a rotação das galáxias e as lentes gravitacionais. Essa falta de evidência direta mantém abertas as portas para hipóteses alternativas sobre o funcionamento do Universo.

Nem energia escura, nem matéria escura

O novo estudo, liderado pelo físico Rajendra Gupta, da Universidade de Ottawa, no Canadá, sugere uma alternativa ousada. Segundo o astrônomo, não é necessário imaginar partículas invisíveis ou forças misteriosas. Em sua visão, a intensidade das forças fundamentais pode mudar ao longo do tempo, criando a impressão de que algo desconhecido atua no cosmos. Isso abriria uma nova forma de interpretar os mesmos dados que hoje sustentam as teorias da matéria e energia escuras.

Para Gupta, à medida que o Universo se expande, suas forças enfraquecem. Isso dá a impressão de que uma energia invisível acelera sua expansão. Já em escalas menores, como galáxias ou aglomerados, essa variação gera um efeito de gravidade extra. O fenômeno seria interpretado como matéria escura, mas na verdade resultaria apenas das chamadas “constantes de acoplamento covariantes” (CCC).

Essas constantes representam a força da gravidade, do eletromagnetismo e de outras interações. Em um comunicado, Gupta explica que elas não são fixas em todo o espaço, mas variam de acordo com a quantidade de matéria presente em cada região. Em áreas densas, sua contribuição é menor; em regiões vazias, é maior. Essa diferença poderia explicar tanto as curvas de rotação das galáxias quanto a aceleração cósmica sem recorrer a elementos invisíveis.

Mapa do universo com a Terra no centro e cada galáxia marcada como um ponto. Embora desenvolvido para a busca de matéria escura, seus dados também foram úteis para encontrar a matéria comum desaparecida. Crédito: colaboração DESI e KPNO / NOIRLab / NSF / AURA / R. Proctor

Um ponto forte da proposta é que ela unificaria fenômenos que hoje são tratados de forma separada. No modelo padrão, a energia escura explica os efeitos em escalas cósmicas gigantes, enquanto a matéria escura atua em escalas menores, como as galáxias. O modelo de Gupta, por outro lado, afirma que uma única equação seria capaz de explicar ambos os casos.

Isso também incluiria efeitos conhecidos como lentes gravitacionais, em que a luz se curva ao passar perto de grandes massas. Para Gupta, a variação das constantes já seria suficiente para justificar esse fenômeno. Ele argumenta que o modelo pode reproduzir, de forma simplificada, os principais resultados observados pelos astrônomos, sem necessidade de introduzir componentes invisíveis no Universo.

Apesar da ousadia, a hipótese enfrenta fortes críticas. Muitos especialistas afirmam que ela não está de acordo com grande parte das observações acumuladas ao longo das últimas décadas. A professora Tamara Davis, da Universidade de Queensland, Austrália, lembra que há inúmeras medições que apontam para a idade do Universo em cerca de 14 bilhões de anos, e não 26 bilhões, como Gupta sugeriu em outro artigo em 2023.

Ao site IFLScience, ela afirmou que ajustar um modelo apenas aos dados de supernovas, como fez Gupta, é insuficiente. A cosmologia atual usa diferentes fontes de informação, como a radiação cósmica de fundo e a idade das estrelas mais antigas, que reforçam a estimativa de 14 bilhões de anos. Ignorar esses elementos, diz a pesquisadora, torna o modelo menos confiável.

Outra crítica é que a proposta resgata ideias antigas, como a chamada “luz cansada”. Essa teoria sugeria que a luz de galáxias distantes ficava mais fraca e avermelhada apenas por atravessar o espaço, sem necessidade de expansão cósmica. Hoje ela é considerada ultrapassada porque não se ajusta aos dados observacionais. 

Ilustração de matéria escura
Representação artística da matéria escura, que, junto com a energia escura, compõe quase 90% do Universo, segundo os modelos tradicionais do cosmos. Crédito: KIPC/SLAC?AMNH

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O segredo da expansão do Universo pode estar na simplicidade

Ainda assim, Gupta insiste que sua hipótese pode resolver enigmas difíceis. “Durante anos, lutamos para explicar como as galáxias no Universo primitivo se formaram tão rapidamente e se tornaram tão massivas”, disse o pesquisador. “Com o nosso modelo, não precisamos presumir a existência de partículas exóticas nem quebrar as regras da física. A linha do tempo do Universo simplesmente se estende, quase dobrando sua idade e abrindo espaço para tudo o que observamos.”

Na visão do físico, a força de sua proposta está na simplicidade. Se as constantes fundamentais realmente variam, não seria necessário imaginar substâncias invisíveis preenchendo o Universo. As observações, como a rotação das galáxias e a aceleração cósmica, seriam apenas efeitos naturais dessas variações. Isso tornaria o quadro mais direto, sem multiplicar hipóteses.

Esse debate demonstra como a ciência funciona: novas ideias surgem, enfrentam críticas e precisam ser testadas contra uma ampla gama de dados. A hipótese de Gupta ainda está longe de substituir o modelo tradicional da energia escura e da matéria escura fria. Mas destaca a importância de explorar alternativas para os maiores mistérios da cosmologia.

Talvez, realmente, o Universo não esconda partículas invisíveis nem forças misteriosas. É possível que as próprias leis da natureza sejam mais flexíveis do que imaginamos, mudando ao longo de bilhões de anos. Se for esse o caso, os segredos do cosmos podem estar nas sutis variações das forças fundamentais, e não em elementos ocultos esperando para serem encontrados. Mas, isso, só o tempo e a evolução dos estudos podem responder.

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