Após uma demonstração de força e articulação, o governo federal conseguiu aprovar de forma unânime na Câmara dos Deputados, no dia 1º de outubro, o projeto de lei que trata da Reforma do Imposto de Renda.
Considerada uma pauta prioritária para o governo, a matéria encontrou consenso entre “gregos” e “troianos” e seguiu para o Senado Federal. Em contrapartida, o governo Lula viu perder a vigência e eficácia da MP 1303/2025, que trazia em seu texto original a tributação de várias aplicações financeiras, incluindo a criação de uma alíquota de Imposto de Renda sobre as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) e, também, sobre fundos como o Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagros).
O texto inicialmente proposto sofreu diversas modificações e, entre pareceres e complementações de voto, foi desidratado e aprovado em Comissão Mista com apenas um voto de diferença (13 a 12), na véspera de sua caducidade.
Com o tempo se esgotando e sem a garantia dos votos necessários para a sua aprovação, o governo adotou a estratégia do “tudo ou nada”, pautando o projeto no Plenário da Câmara dos Deputados. Utilizando o primeiro instrumento de obstrução, a oposição conseguiu retirar o projeto da pauta com 251 votos favoráveis e 193 contrários, encerrando suas chances de aprovação.
O cálculo do governo era de que, se aprovada, a MP 1303/2025 representaria a segunda vitória consecutiva, após a unanimidade na votação da reforma do Imposto de Renda, sem contar o amistoso telefonema de Trump no dia 6 de outubro. Ventos bons sopravam. Com a rejeição do projeto, o governo Lula poderia atribuir ao Congresso Nacional a falta de compromisso com as contas públicas.
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O segundo cenário se concretizou e agora Lula já sinaliza que precisará buscar novas formas de arrecadação. O fato é que há um cenário constante de recursos insuficientes para financiar as atividades do agronegócio – o Plano Safra 2025/26 trouxe um montante de R$ 516,2 bilhões, enquanto as entidades representativas do setor pleiteavam R$ 599 bilhões.
Nesse contexto, instrumentos como LCA, CRA e Fiagro representam um acréscimo de fomento para uma atividade que responde por quase 25% do PIB brasileiro e por 28,34 milhões de empregos diretos e indiretos, de acordo com dados apresentados pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) em 2023.
Tributar tais investimentos diminuiria sua atratividade, gerando, por consequência, menos recursos para a atividade agropecuária. É sabido que a força do agronegócio também está representada no Congresso Nacional, onde a bancada do agro é composta por mais de 300 parlamentares. Mesmo com as concessões realizadas pelo relator da MP 1303/2025, a bancada não estava convencida da pertinência da aprovação da matéria, ao contrário do que ocorreu na votação da reforma do Imposto de Renda.
Assim como na discussão do IOF, que necessitou de uma decisão do Poder Judiciário para voltar a vigorar após o Congresso Nacional aprovar a suspensão dos efeitos do decreto do Poder Executivo que impunha o aumento do tributo, o governo Lula enfrenta outros temas sensíveis que precisarão de forte articulação entre os parlamentares para serem aprovados.
Aumentar tributos é uma alternativa ao corte de gastos, especialmente com a eleição presidencial se aproximando. Contudo, para conquistar o apoio da maior bancada do Congresso, tão necessário para a aprovação de pautas relevantes, o governo tem o desafio de conciliar sua necessidade de arrecadação com a demonstração de responsabilidade em relação a um setor forte e fundamental não apenas para o Brasil, mas para o mundo. Assim, tributar ou não tributar, eis a questão.

*Karina Tiezzi é gerente de Relações Governamentais da BMJ Consultores Associados e consultora em Relações Governamentais. Atuou como assessora legislativa na Câmara dos Deputados, participou da tramitação de proposições de destaque para o setor do Agronegócio, como a chamada MP do Agro (Lei 13.986/2020) e a Lei Geral do Licenciamento Ambiental (PL 3729/2004).
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