O Núcleo de Controle e Fiscalização do Sistema Prisional (Nupri) do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) constatou, durante inspeções realizadas neste ano, que cinco dos sete presídios da capital do país encontram-se superlotados.
As unidades Centro de Internamento e Reeducação (CIR), Penitenciária do Distrito Federal II (PDF II) e Penitenciária do Distrito Federal (PDF I) destacam-se com altas taxas de superlotação, sendo o CIR o mais crítico, com 220% de densidade carcerária.
Em contrapartida, o Centro de Progressão Penitenciária (CPP) opera próximo da capacidade (96,8%) e a Penitenciária Feminina do Distrito Federal (PFDF) possui ocupação de 64,4%, sem contabilizar a Ala de Tratamento Psiquiátrico.
Os dados fazem parte da Nota Técnica nº 04/2024, elaborada pelo Nupri, que traz uma análise detalhada sobre a capacidade e a lotação dos estabelecimentos penais do Distrito Federal.
A promotora de Justiça Vanessa Farias cita que uma das alternativas direcionadas à Secretaria de Administração Penitenciária (Seape-DF) para mitigar a superlotação nas unidades mais críticas foi a ativação da PDF IV, aliada a outras medidas, como a ativação de blocos antes em desuso.
Conforme comprovam os dados levantados, observou-se o decrescimento de 59,8% da taxa de densidade carcerária para o regime fechado masculino após a mudança (passando de 247,7% para 187,9%).
Ao passo em que no regime provisório, sobretudo a partir do aprimoramento da disponibilização e racionalização das vagas, esta taxa aumentou apenas 2% (passando de 141% para 143%).
“A gente vê que a falta de servidor é algo que também impacta na superlotação, porque como não tinha servidor suficiente, alguns blocos estavam inativos. Com a chegada desses novos policiais foi possível que a Seape fizesse essa logística, que teve o nosso parecer favorável, para que pudesse mitigar um pouco a superlotação do regime fechado”, explica a coordenadora do Nupri.
Na visão de Vanessa, a principal medida para lidar com a superlotação nos presídios seria a criação de uma infraestrutura compatível com a massa carcerária do DF.
“Na gestão dos recursos públicos, que são limitados, nem sempre o sistema prisional é colocado como prioridade. O Ministério Público entrou com uma Ação Civil Pública há muitos anos para a criação de mil vagas no regime semiaberto, por meio da construção de uma colônia penal industrial. Já fazem cinco anos que transitou em julgado, e a gente não tem sequer o projeto. O litígio é muito grande”, pondera.
A construção da Penitenciária do Distrito Federal III (PDF III), com 600 vagas, também é uma demanda histórica do sistema prisional local, cuja relevância foi reiteradamente apontada pelos órgãos de fiscalização e controle. Embora a execução desse projeto tenha, até o momento, apresentado um desempenho insatisfatório, com um avanço físico aquém do previsto no cronograma.
Sistema prisional alternativo
O MPDFT também defende a construção da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac), que é uma unidade prisional gerida pela sociedade civil que adota um método alternativo de gestão prisional. Atualmente existem cerca de 70 Apacs em funcionamento no país.
A Apac opera como entidade auxiliar do poder Judiciário e Executivo, respectivamente, na execução penal e na administração do cumprimento das penas. A segurança e a disciplina são feitas com a colaboração dos recuperandos, tendo como suporte alguns funcionários e voluntários, sem o concurso de policiais ou agentes penitenciários.
“A gente está em uma batalha para que seja construída, pelo menos, a primeira Apac do DF. Porém, até o momento, não tivemos uma posição favorável do GDF para implementação desse tipo de unidade. Já temos a sociedade civil bem articulada nesse sentido, e uma pessoa jurídica constituída. Estamos aguardando apoio institucional, como também, buscando recursos públicos”, detalha a coordenadora do Nupri.
O objetivo da associação é promover a humanização das prisões, sem perder de vista a finalidade punitiva da pena. Seu propósito é evitar a reincidência no crime e oferecer alternativas para o condenado se recuperar. Além disso, as unidades são idealizadas para receber no máximo 200 recuperandos.
“O custo de um preso na Apac é menor do que o custo do preso no sistema tradicional. Em alguns Estados já se estimou que o custo é de um terço quando comparado. E, além disso, estudos indicam que as taxas de reincidência são bem menores. É um método que já tem essas experiências positivas”, cita.
Impactos da superlotação
A superlotação contribui para a disseminação de doenças, o aumento da violência entre presos e a degradação das condições de vida nas unidades prisionais.
No contexto do Distrito Federal, vale frisar, apesar dos desafios impostos pela superlotação e pelas dificuldades de gestão, a segurança é assegurada, o que tem sido fundamental para evitar impactos mais severos que poderiam surgir em decorrência do excesso populacional.
“Em relação aos direitos dos internos também há um reflexo. Até mesmo nas oportunidades de trabalhar, de estudar, o sistema prisional não vai conseguir abranger um número tão grande de internos, então muitos vão ficar com essa deficiência. A questão de atendimento à saúde também pode ficar mais prejudicada, por conta do número excessivo de internos. Até o banho de sol pode ser afetado por falta de efetivo”, acrescenta a promotora.
Vanessa também cita que em celas com um número que excede a capacidade há dificuldade até mesmo para dormir, visto que não tem espaço para todos se deitarem.
“Os presos costumam improvisar algumas redes com lençóis para dormir. A gente sente que é uma violação de direitos essa superlotação, porque até mesmo o consumo da alimentação é feito de forma mais improvisada. A questão da superlotação afeta direitos relacionados à dignidade humana”, avalia.
Além da questão da construção de novas unidades, a promotora também menciona que antecipação de benefícios, uso de tornozeleira eletrônica em presos do semiaberto e nova sistemática de análise das remissões podem promover a redução da superlotação.
“Na medida que eles não têm a dignidade violada, e têm instrumentos para que possam retornar para a sociedade, eles vão sair como pessoas melhores”, pontua.
FONTE: Metrópoles